O presbítero vive da Palavra que sai da boca de Deus (cf. Mt
4,4; Dt 8,3), se faz servo desta Palavra (cf. At 6,4) e se torna seu anunciador no meio da comunidade do Senhor; tudo isso, porém, só é possível e fecundo se o presbítero é um homem de oração. Ninguém nega que a oração seja importante e essencial na vida do presbítero, no entanto na prática se deve constatar – e são os próprios presbíteros que o confessam pessoalmente – que muitas vezes a oração não é prioridade na vida presbiteral e que nem sempre ela é feita na sua forma autenticamente cristã.O presbítero, já observamos, estando absorvido por múltiplas atividades e serviços, corre o risco de não reservar à oração o tempo devido, de não vivê-la como fonte do seu sentir e do seu agir. Pelo contrário, às vezes é tentado a utilizá-la de forma funcional, de transformá-la em algo que serve imediatamente ao seu agir: medita em vista da homilia ou de uma conferência, pesquisa na Escritura e nos Padres para aumentar a própria bagagem intelectual que deve ser comunicada no próximo encontro, ora pensando nos projetos pastorais, sem porém colocar estes projetos diante de Deus para fazer um discernimento em obediência a ele...
É verdade que os presbíteros hoje oram pouco, mas tendo tido com freqüência a oportunidade de escutá-los penso que sobretudo eles oram mal, sem reconhecer ou viver o estatuto da oração cristã. E o estatuto da oração cristã requer que antes de falar com Deus, antes de "pensar" Deus ou de desenvolver pensamentos sobre Deus e os seus mistérios, a pessoa que deseja orar deve se esforçar em escutar Deus! É a escuta a forma essencial e fundamental da oração cristã, e isto vale sobretudo para o presbítero, porque o que ele pode anunciar e testemunhar depende daquilo que escuta. Quem é chamado a presidir a comunidade do Senhor deve antes de tudo pedir a Deus um "coração que escuta", um lev shomea‛ – (1Rs 3,9), e como "sentinela" do povo de Deus deve estar sempre à escuta da Palavra proveniente da boca do Senhor, para comunicá-la à sua comunidade (cf. Ez 3,16-21). O exercício da escuta de Deus, é claro, na sua Palavra santa, mas não somente, também na profundeza do coração do homem, onde o Pai habita, Cristo fala e o Espírito ora.
Por isso, o ato de escutar é o primeiro exercício da oração cristã; se, ao contrário, a oração é feita apenas falando com Deus, termina-se por viver a oração com um sentimento de frustração e se chega a acusar o próprio Deus de fazer silêncio conosco, quando ao contrário dever-se-ia admitir que somos nós os surdos, somos nós quem não escutamos! Porque muitos, quando confessam estar em crise e de ter graves dificuldades na oração, se precipitam dizendo: "Porque Deus faz silêncio comigo? Porque não me diz nada?", e não se perguntam ao contrário se não seriam eles a estar surdos? Se o presbítero é um homem assíduo na escuta de Deus, se é verdadeiramente o servo do Senhor que escuta como discípulo iniciado (cf. 10
Is
50,4), então também será capaz de escutar o irmão, de escutar o "mundo". Muitas vezes as pessoas reclamam do fato que os presbíteros não têm mais tempo de escutar; pois bem, por traz desta lamúria nem sempre justa e pertinente se esconde porém também um apelo, uma necessidade que não pode deixar de nos interrogar. Sim, no fundo, quem tem um coração que escuta a Deus, também possui um coração para a escuta dos homens!Além disso, a escuta é essencial para a realização do discernimento, o ato que na oração deveria unir a vontade de Deus – manifestada no coração pelo Espírito Santo – com o nosso pensamento. O termo que em hebraico define a oração, tefillah – , significa literalmente "juízo": a oração é a possibilidade de julgar com Deus, de realizar um discernimento sobre a própria vida, sobre a relação com os outros, sobre o próprio relacionamento com as criaturas. É assim que se ordena e se aprofunda a própria interioridade, que se mede o próprio caminho humano, o próprio amadurecimento como crescimento interior adequado à própria idade e à própria situação... Quem é chamado a presidir a Igreja de Deus, a edificá-la com o seu serviço apostólico, a organizá-la e a governá-la, deve ter entre os carismas necessário para o seu ministério sobretudo o discernimento. Capacidade que deve ser invocada e pedida a Deus, e que, ao mesmo tempo, deve ser afinada e exercitada sempre e de novo através da escuta. Nunca será demais recomendá-lo!
Ao lado desta escuta que faz do orante uma sentinela está a escuta dos irmãos, como se disse um pouco atrás, a escuta dos homens que deve, por sua vez, inspirar a oração, deve fazer chegar até Deus " súplicas, orações, intercessões, ação de graças por todas as pessoas" (1Tim 2,1). É da escuta dos homens que nasce a oração como intercessão. De fato, interceder significa "dar um passo entre", ou seja, indica um comprometimento ativo, uma ação para colocar em comunicação Deus e os homens, sobretudo aqueles que não sabem que estão nesta comunicação ou não querem estar: é assim que o presbítero se torna ministro da compaixão! Na intercessão o presbítero exercita mais do que nunca o seu ministério de pastor: "pois ele vela [sobre a comunidade] como quem há de prestar contas" (Heb 13,17) e, consciente de tal responsabilidade, ele deve apresentar a Deus as ovelhas que conhece e sabe chamar pelo nome (cf. Jo 10,2-4), e as multidões pelas quais sente compaixão (cf. Mc 6,34; 8,2). Esta é uma tarefa grave, mas que o pastor sabe que deve realizar para que, de forma autêntica e radical, possa assumir a responsabilidade por aqueles que lhe foram confiados.
Seja-me permitido aqui recordar o que eu, que por minha vez sou pastor de uma comunidade, sinto como um dever absoluto todas as noites antes de me deitar: recordar diante de Deus os irmãos e as irmãs que foram confiados à minha condução pelo Senhor, para invocar sobre eles "graça 11
sobre graça" (Jo 1,16) e a misericórdia da qual necessitam, mas também para abrir o meu coração às suas necessidades e examinar diante de Deus o meu serviço para com eles, a minha relação com eles. A intercessão do presbítero em favor dos que lhe foram confiados e por todos os homens é na verdade um cadinho de comunhão, um lugar de purificação das relações, um instrumento para assumir as responsabilidades pastorais, uma ocasião de luta contra o cinismo que ameaça, sobretudo com o passar dos anos, o "cuidado pastoral" do próprio presbítero. À imagem de Cristo intercessor diante do Pai (cf. Heb 7,25), o pastor da comunidade do Senhor deve invocar de Deus misericórdia; e se na pregação se coloca do lado de Deus para anunciar à Igreja a sua vontade muitas vezes exigente diante da não escuta de um "povo de dura cerviz" (cf. Ex 32,9; 33,3; etc.), de uma "raça de rebeldes" (cf. Ex 2,5-8; 3,9; etc.), na intercessão deve se colocar do lado do povo para recordar a Deus o seu amor fiel, a sua compaixão que nunca se extingue!
Colocado entre esta escuta e esta intercessão, o presbítero não esquecerá por outro lado a adoração, o louvor, a ação de graças, cujo cume está, sem dúvida, na liturgia eucarística. A adoração é um ato extremamente elementar e simples, mas talvez o mais esquecido dentro da oração. Ela consiste no estar diante de Deus, em oferecer-lhe a própria presença, o próprio ser corpo e espírito, e fazer isto com simplicidade e gratuidade até poder dizer ao Senhor: "Eu estou diante de ti, tu és o Senhor vivente e presente". Desta consciência se vê brotar o louvor e a ação de graças, o canto do Magnificat que deve ser entoado não apenas todas as tardes nas vésperas, mas que deve ser elevado mais vezes durante o dia, quase como um cantus firmus que testemunha a nossa abertura à comunhão com o Senhor. Tal comunhão deve ser constantemente renovada através da oração, que é verdadeiramente cristã quando se torna uma memoria Dei, uma consciência da presença de Deus na nossa vida. Quando o presbítero, mesmo com timidez chega a pensar: "Cristo e eu vivemos juntos" (cf. Gal 2,20), então esta oração contínua começa a habitá-lo...
É verdade, a oração é uma obra difícil e cansativa, uma tarefa que nunca chega a termo, um esforço que deve ser renovado até a hora da própria morte, uma arte que deve ser sempre aprendida. Mesmo antes da morte dever-se-á pedir ao Senhor que nos ensine a orar (cf. Lc 11,1). Mas, se a nossa tentativa de orar for perseverante e cotidiana, a oração realizará muito mais do que o que vemos e percebemos... Se para cada cristão a oração é eloqüência da fé, isto vale certamente também para o presbítero, mas com uma particularidade: para ele a oração é eloqüência de seu ministério!
Diác. Aganldo Bueno
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